Interessante entrevista com o professor Jáder. 

Fica a pergunta: os Estudantes de Administração são "enganados" em sala de aula ou alguns professores desconhecem a teoria de Maslow?


A GESTÃO DE PESSOAS E A MOTIVAÇÃO: O MASLOW DESCONHECIDO.

Jáder dos Reis Sampaio, especialista em psicologia do trabalho e desenvolvimento organizacional da Universidade Federal de Minas Gerais, é organizador do livro Qualidade de Vida no Trabalho e Psicologia Social e já prestou consultoria a organizações tão diversas como o Sesc-MG, a Polícia Militar de Minas Gerais e a fabricante de eletrodomésticos Multibrás, dona da marca Brastemp.

Jáder dos Reis Sampaio, professor de psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirma que a pirâmide de necessidades de Abraham Maslow, tão usada nas políticas empresariais de gestão de pessoas, não existe. E discute os melhores modos de motivar os funcionários competitiva nas empresas dos Estados Unidos e da Europa. As empresas brasileiras também os vêem assim?
Funcionários motivados são considerados, cada vez mais, uma vantagem Depois da reestruturação produtiva no Brasil, com a chegada de novas tecnologias e novas formas de gestão, a motivação se tornou, de fato, estratégica para muitas empresas. A produção flexível e a disputa por nichos de mercado necessitam de pessoas inteligentes, comprometidas e motivadas com o trabalho, para que se
envolvam e sugiram mudanças nos produtos, processos e serviços.

Você fez recentemente um estudo aprofundado da obra do psicólogo norte-americano Abraham Maslow, que ainda é a principal base das políticas motivacionais ensinadas nas faculdades e adotadas pelos departamentos de recursos humanos. O que você descobriu?

Fiquei realmente surpreso. Ao ler a grande maioria dos manuais de Administração ou Comportamento Organizacional, é possível pensar que ele “empilhou” os componentes da motivação em uma espécie de pirâmide, na qual só se chega ao segundo degrau após ter superado o primeiro.
Contudo, ao examinar sua obra, descobre-se que não há pirâmide. Não encontrei nenhuma pirâmide nos textos dele.

Não há pirâmide? Como assim? Outros autores criaram a pirâmide em nome de Maslow?

Ao que tudo indica, sim. Talvez a melhor imagem para as idéias de Maslow seja a de duas “torres gêmeas”. Uma delas contém necessidades cujo mecanismo básico é a homeostase. Uma vez gratificada, a necessidade se torna menos motivadora. A outra torre acomoda necessidades que, quanto mais gratificadas, mais motivam a pessoa. Você começa a aprender, por exemplo, e nunca se sacia de querer HSM Management Update nº25 - Outubro 2005 

Os fatores de motivação são partes dinâmicas do psiquismo de uma mesma pessoa, não degraus de uma pirâmide. O diretor da empresa também tem necessidades fisiológicas, como se exercitar, e o operário também tem a necessidade de ser respeitado saber mais. Fica cada vez mais curioso. Domina um idioma e se interessa por estudar outros, especialmente se você sente prazer em aprender línguas estrangeiras e percebe que está desenvolvendo suas habilidades. A imagem da pirâmide não tem a ver com Maslow, que, inclusive, foi mudando suas idéias com o passar do tempo e com a observação das pessoas e das organizações.



            Abraham Maslow descobriu durante sua carreira que suas idéias tinham valor para a sociedade norte-americana de sua época, nas décadas de 1950 e 1960, e que podiam não funcionar em organizações de outros países. Ele não defendeu que a natureza humana impõe uma motivação que vai das necessidades fisiológicas até a auto-realização. Disse apenas que essa é uma forma típica de fazer escolhas adotada por seus compatriotas de maneira geral.
Além disso, a satisfação de um dos níveis de motivação, a que se denomina “gratificação parcial”, é, segundo Maslow, temporária. Não se classifica uma pessoa em um dos níveis (fulano está no nível das necessidades fisiológicas, sicrano está no nível da auto-estima e beltrano teria chegado ao nível da auto-realização...).
            Todos esses fatores de motivação são partes dinâmicas do psiquismo de uma mesma pessoa. Sua preponderância é apenas temporária, salvo em situações extremas, nas quais a falta de qualquer um desses fatores é crônica e sua obtenção incerta, como uma situação de guerra ou de penúria extrema.
            Em outras palavras, isso significa pensar que o operário do chão de fábrica quer ser respeitado e que o diretor de empresas tem necessidades fisiológicas, que não podem ser esquecidas. Nesse exemplo extremo, o diretor necessita exercitar-se e o operário necessita ser respeitado.

As faculdades de administração ainda apresentam Maslow sob essa forma da pirâmide, não? A seu ver, elas continuam a ensinar esse autor, e as teorias de motivação de modo geral, com uma imagem mecanicista e determinista?

Infelizmente sim.

E qual o efeito disso sobre o aluno que se tornará gestor da empresa?

Isso cria uma ilusão no profissional que trabalha com gestão. Ele pode acreditar que os trabalhadores de chão de fábrica se importam apenas com o salário e que fazer uma política de benefícios para esse nível hierárquico é distribuir cestas básicas, por exemplo.
Já nos anos 50, outros pesquisadores diziam que os supervisores pensam que conhecem seus subordinados e o que eles desejam, mas, quando é feita uma pesquisa, constata-se que muito do que pensavam está equivocado.

Como esses supervisores podem saber o que motiva seus subordinados?

Eles devem entender que não podem dizer o que motiva as pessoas com base em uma teoria de motivação. Eles precisam consultar seus subordinados, com pesquisa e diálogo.

O que pode acontecer na prática quando uma empresa faz políticas de gestão empregando a teoria da hierarquia das necessidades de Maslow como subsídio?

Há dois empregos possíveis. Um deles é acreditar na hierarquia das necessidades a priori –como pirâmide– e implementar inúmeras ações e programas. Não chega a ser desastroso, mas a empresa perderá a oportunidade de criar condições reais para aumentar a satisfação e o comprometimento dos empregados.



Usando a priori a hierarquia de necessidades de Maslow, a empresa perderá a oportunidade de criar condições reais para aumentar a satisfação e o comprometimento dos empregados. Outra situação é aceitar que a motivação tem as diversas dimensões apontadas por Maslow, que variam da remuneração e da segurança do emprego à realização pessoal e à aprendizagem das pessoas, e admitir que sua inobservância pode criar insatisfação. Vista dessa forma, a teoria de Maslow é benéfica, pois ajuda muito a entender o que necessitam e desejam os diversos colaboradores de uma organização e como agir para motivá-los.

As idéias de Maslow são realmente um bom subsídio para a formulação de políticas
de gestão de pessoas?

É muito difícil, apenas com as idéias de Maslow, traçar programas de gestão de pessoas. Elas são boas para entender as pessoas individualmente, mas falaciosas para fundamentar ações coletivas. Dão um bom quadro de referência para levantar demandas de ordens diferentes.

Você escreveu em seu estudo que Maslow rejeitou o individualismo e os reducionismos sociológicos cometidos por alguns estudiosos da área. Muitas das atuais políticas corporativas de gestão de pessoas, no entanto, também são reducionistas. Quais são os erros mais freqüentes das empresas no que diz respeito à motivação?

Quando elas remuneram no “terceiro quartil”, ou seja, bem acima da média de mercado, e não explicam a seus empregados qual é a estratégia da empresa, o que é esperado deles ou como podem contribuir para o aperfeiçoamento da companhia, estão errando.

Estão pressupondo, da mesma forma que Taylor, no final do século 19, que as pessoas querem apenas dinheiro e que devem submeter-se às exigências do trabalho, se não quiserem ser substituídas.
Possivelmente essas empresas conseguem reduzir sua rotatividade, mas não conseguem, apenas com isso, fazer com que as pessoas se envolvam realmente com seu trabalho, que invistam o melhor de suas competências nele.
Quando uma empresa acredita que todos os empregados desejam fazer carreira na empresa e ocupar um cargo de direção, também está baseando-se em uma crença que pode ser verdadeira para uns, mas que nada tem a ver com outros.

Você destacou que o Prefácio à Teoria da Motivação de Maslow, no qual ele enumerou 16 proposições “que precisam ser incorporadas a qualquer teoria relevante de motivação”, costuma ser ignorado, embora seja importante. Você pode falar um pouco sobre essas proposições e sua relevância nos dias atuais?

Nesse capítulo, Maslow dialoga com os autores que já haviam produzido trabalhos sobre motivação em sua época. Ele defende uma posição muito aceita hoje, mas considerada duvidosa naquele período: a de que se deve estudar a pessoa como um todo e aceitar que é um ser biológico, psicológico e social ao mesmo tempo.
Maslow parte do princípio de que um motivo de base biológica –como a fome, por exemplo– não é apenas resultado de alguma deficiência de nutrientes no corpo humano, mas tem uma dimensão psicológica e uma dimensão social. Do ponto de vista psicológico, apesar de estar com fome, uma pessoa não come qualquer alimento que contenha o nutriente necessário ao corpo; prefere uma comida cujo sabor lhe dê prazer. Do ponto de vista social, há alimentos que uma cultura proíbe ou incentiva, há formas de se alimentar instituídas, há instrumentos que devem ser usados, modos à mesa considerados educados ou não.
Muitas empresas estão pressupondo que as pessoas querem apenas dinheiro e que devem ubmeter-se às exigências do trabalho se não quiserem ser substituídas.
Esse raciocínio fez com que Maslow desse mais atenção à intencionalidade das pessoas, por que elas agem, com que finalidade elas fazem escolhas, abandonando uma tradição de pesquisas que focalizava as bases biológicas da motivação. Por essa razão, ao estudar motivação, Maslow sugeriu que se analisassem as necessidades e não os instintos, os impulsos ou os comportamentos isolados. As necessidades são “os objetivos últimos”, a trama complexa da finalidade que as pessoas tentam atingir com suas ações.

Seu estudo mostra que a hierarquia de necessidades de Maslow compreendeu originalmente sete grandes categorias e, no entanto, a maioria dos livros de comportamento organizacional focaliza apenas cinco. Por que isso aconteceu? É sinal de que os estudiosos de Maslow não estudaram Maslow?

Ele desenvolveu melhor as duas últimas categorias: desejos de saber e de entender  estéticas, que podem ser vistas como um desdobramento da auto-e necessidades realização ou auto-atualização, mais tarde. Mas o que intriga é que ele já falava dessas dimensões da motivação em 1954, no livro Motivação e Personalidade.
Não tenho como generalizar, mas muitos dos manuais que apresentam a teoria de Maslow citam apenas o primeiro artigo dele. Suspeito que os autores foram escrevendo os livros de geração em geração sem acompanhar a evolução dos escritos dele e tomaram sua formulação inicial como uma espécie de “lei da motivação” e não imaginaram que Maslow fosse modificá-la com o passar do tempo e em resposta à crítica que suas idéias suscitaram.

Segundo seu estudo, Maslow considerava utópica a meta de um administrador que pretendesse dar fim às reclamações dos trabalhadores na empresa. Os gestores devem conformar-se que sempre haverá reclamações?

Sim. Se ninguém relata queixa alguma, realmente é sinal de que há algum problema de comunicação.

 O que os gestores têm de fazer para melhorar a comunicação, de acordo com sua experiência?

No nível estratégico, remuneração à parte, os gestores devem fazer pesquisas de satisfação/insatisfação no trabalho e identificar fontes de estresse e de sofrimento psíquico. Nos níveis tático/operacional, eles devem conversar com seus subordinados sobre o trabalho e tentar entender quais são suas queixas mais constantes, quais são suas metas e objetivos, suas frustrações e ambições.

Você escreveu que “outra contribuição do pensamento de Maslow repousa no repúdio em transformar o lugar de trabalho na instância por excelência de gratificação das necessidades das pessoas, ou no espaço privilegiado de sua realização”. Não é exatamente essa realização no trabalho que muitas empresas da nova economia prometem?

Isso acontece, de fato, mas não é intencional. Essas empresas geralmente operam em um ramo de negócios no qual a aquisição e o descarte do conhecimento são contínuos. E o técnico da área geralmente gosta do que faz. Se tanto ele como a organização não valorizam outras instâncias como a família e a comunidade, ele se vê levado a dedicar-se mais e mais a seu trabalho, e acaba condenado a ele.

Se ninguém relata queixa alguma, realmente é sinal de que há algum problema de comunicação Junta-se a isso o tipo de vínculo de emprego que esse técnico estabelece, que costuma ser o de prestação de serviços ou uma contratação de laço frágil, pronta a ser rompida por qualquer uma das partes.
Isso não ocorre somente com empresas ponto.com. No mundo acadêmico pode acontecer também, em menor escala.

Gostaria que você apresentasse um pouco da segunda fase da obra de Maslow. Ele desenvolveu o duplo mecanismo para motivações, criando conceitos como o da metamotivação.

Quanto mais um técnico de manutenção é capaz de identificar e resolver o problema de uma máquina, mais ele deseja fazê-lo e mais ele quer aprender a fazer. Isso é uma metamotivação. O trabalho é motivador em si; fazê-lo bem incentiva o profissional a querer fazer mais e melhor. Ele se sente crescendo com seu trabalho. É, sem dúvida, um conceito importante para entender a motivação hoje.

Analisando a obra completa de Maslow e com toda sua experiência dos dias atuais, qual é, em sua opinião, a receita de motivação?

As pesquisas de clima organizacional para “mapear” as fontes de satisfação e insatisfação das pessoas, a seleção de pessoas não apenas qualificadas, mas interessadas em seu trabalho e o acesso ao desenvolvimento profissional.
Há também muitas outras ações possíveis, como preparar as chefias intermediárias para entender como seus empregados vêem o trabalho, quais são suas necessidades e ansiedades, quais são suas aspirações. Flexibilizar a organização pode ajudar a criar espaços de trabalho que possibilitem ao empregado alternativas de trabalho.
Mas vale lembrar que, além das ações da organização, não se deve esquecer que o empregado é um dos artífices de sua motivação.

A insegurança no emprego não atrapalha qualquer política de motivação?

A questão da segurança do emprego é bem complexa. Há setores da economia nos quais a insegurança é alta, porque há elevada “mortalidade” e “mutabilidade” das organizações. Existem outros em que a estratégia de competição de empregadores ou de empregados é baseada na rotatividade de pessoal. Mas há também setores e empresas que adotam estratégias mais estáveis. Em cada um desses cenários, a motivação ganha um contorno diferente.
Como exemplo, uma empresa do tipo ponto.com, que se encontra no primeiro grupo, com baixíssima retenção de pessoal, pode ser motivadora para o empregado se lhe possibilita estar atualizado em sua área de atuação e aplicando seus conhecimentos.
Mas há que se considerar todo o contexto para evitar generalizações indevidas.

Jáder dos Reis Sampaio, especialista em psicologia do trabalho e desenvolvimento organizacional, é professor adjunto do departamento de psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É organizador dos livros Qualidade de Vida no Trabalho e Psicologia Social e Psicologia do Trabalho e Gestão de Recursos Humanos, publicados pela Casa do Psicólogo, respectivamente, em 2004 e 1998, e co-autor de As Pessoas na Organização (ed. Gente), entre outros títulos. Sampaio é doutor em administração pela Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) e mestre em administração pelo Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração da UFMG (Cepead-UFMG). Já prestou consultoria a organizações privadas e públicas, como a Polícia Militar de Minas Gerais, a Itaipu Binacional, o Serviço Social do Comércio de Minas Gerais (Sesc-MG), a Multibrás S.A. Eletrodomésticos e a Febem-MG.

Fonte: HSM Management Update nº25 - Outubro 2005 

SABERES DO ADMINISTRADOR

*Administrador não tem casa, tem sua organização.
*Administrador não manda, tem liderança.
*Administrador não trabalha, produz.
*Administrador não tem dinheiro, tem capital.
*Administrador não tem empregado, tem capital humano.
*Administrador não se perde, tem missão.
*Administrador não sonha, tem visão.
*Administrador não tem inimigos, tem concorrentes.
*Administrador não conhece, aumenta sua rede de relacionamento.
*Administrador não cria, tem brainstorming.
*Administrador não cola, faz benchmarking.
*Administrador não vive no mundo, vive no mercado.
*Administrador não estuda, aumenta seu know-how.
*Administrador não tem idéia, tem estratégia.
*Administrador não pesquisa, faz analise swot.


*Ser competente é acertar um alvo que ninguém acertou, ser administrador é acertar um alvo que ninguém viu*
Autor desconhecido.